Esse valor corresponde à subvenção do município para promover a 2ª Semana Cultural Evangélica, ocorrida entre os dias 19 e 23 de junho de 2018. Com a participação de lideranças religiosas e artistas evangélicos, o evento teve cultos, apresentações musicais e exposições de natureza eminentemente confessional.
“Indubitável a instrumentalização do aparato municipal para promoção de culto a crença religiosa específica, em afronta ao disposto no artigo 19, inciso I, da Constituição Federal”, concluiu o desembargador Ricardo Anafe, relator do recurso. O julgador citou ainda a posição do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria.
No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.439, o STF afirmou que a atuação estatal no domínio da liberdade religiosa deve se pautar pela abstenção de promoção ou favorecimento de quaisquer crenças, limitando-se à garantia do exercício livre da fé, sem interferência ou fomento do ente público.
“O princípio da laicidade estatal não se confunde com hostilidade à religião, mas corresponde à neutralidade da administração pública frente à multiplicidade de credos, impossibilitando qualquer manifestação de favorecimento ou privilégio a determinada confissão”, ressaltou Anafe.
Os desembargadores Borelli Thomaz e Flora Maria Nesi Tossi Silva seguiram o relator. Eles também mantiveram a decisão de primeiro grau que condenou o município à obrigação de se abster de promover ou subvencionar, material ou financeiramente, a Semana Cultural Evangélica ou outros eventos de caráter religioso, sob pena de multa de R$ 50 mil por dia de ato.
Proselitismo religioso
A Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea) ajuizou ação civil pública contra o município e o prefeito à época da 2ª Semana Cultural Evangélica, apontando afronta ao princípio constitucional da laicidade do Estado. Os organizadores do evento alegaram que o evento teve natureza “cultural” e objetivou promover a tolerância religiosa.
O ex-prefeito e o município também mencionaram que Ilhabela já conferiu tratamento isonômico a outras manifestações religiosas. Porém, tais argumentos foram rejeitados pelo relator. “A tentativa de qualificação do evento como ‘cultural’ não afasta o seu conteúdo essencialmente religioso.”
Conforme o voto de Anafe, para fins de responsabilização, é irrelevante a nomenclatura adotada pela administração. “Comprovado o dispêndio indevido de recursos públicos para a realização de evento proselitista, impõe-se o reconhecimento da ilicitude da conduta e a consequente condenação do agente público ao ressarcimento do erário.”
O desembargador assinalou que a justificativa de que o município subvencionou outras manifestações religiosas, como as de matriz católica e afro-brasileira, ao invés de afastar, reforça a inconstitucionalidade do ato, “pois a violação à laicidade do Estado não se elide pela alternância de favorecimentos”.
Fonte: ConJur.